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Suicídio e depressão: uma realidade cada vez mais assustadora no capitalismo

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Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), os casos de depressão aumentaram 18% em dez anos (2010-2018) e até 2020 será a doença mais incapacitante do planeta. Junto a esse dado, outro índice também é alarmante: a cada 40 segundos uma pessoa tira a própria vida no mundo.

O Brasil ocupa o 8º lugar em números absolutos e a 113ª posição na média mundial, embora acredita-se que há subnotificação dos casos. De 2007 a 2016, segundo dados do Ministério da Saúde, 106.374 pessoas morreram dessa forma. Somente em 2016, foram registradas 3.097 mortes de adolescentes e jovens de 10 a 29 anos.

O tema ainda é um tabu. Incompreendido, assustador, triste. Mas cada vez mais vem se ampliando o debate sobre essa realidade.

No país, a campanha Setembro Amarelo ganhou destaque desde que foi criada pelo CVV (Centro de Valorização da Vida), pelo Conselho Federal de Medicina e pela Associação Brasileira de Psiquiatria, em 2015, inspirada no Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio (World Suicide Prevention Day), da Associação Internacional de Prevenção do Suicídio (IASP, na sigla em inglês).

Apesar de ser um fenômeno social presente ao longo da história da humanidade, associado a uma série de fatores psicológicos, culturais, sociais e econômicos, o crescimento dos casos em todo o mundo coloca em debate as condições da sociedade atual.

Dois estudos realizados pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e conduzidos pelos psiquiatas Jair Mari, Elson Asevedo e Denisse Jaen-Varas revelam que, entre os anos de 2006 e 2015, as taxas de suicídio em adolescentes no Brasil aumentaram 24%. Indicadores socioeconômicos, particularmente desigualdade social e desemprego, foram considerados determinantes sociais relevantes nesse tema.

Os levantamentos, publicados na revista científica Brazilian Journal of Psychiatry e na Current Opinion in Psychiatry, foram realizados em seis grandes cidades brasileiras (Porto Alegre, Recife, Belo Horizonte, Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo).

De acordo com as pesquisas, níveis mais altos de desemprego foram associados a maiores taxas de suicídio. “Sentimentos de desesperança e inutilidade, que frequentemente ocorrem em quadros depressivos, são frequentemente vistos como mecanismos psicológicos desencadeantes do comportamento suicida. Esses mesmos sentimentos parecem muito prevalentes na geração de jovens desalentados, sem propósitos claros, que nem trabalham nem estudam”, analisa o psiquiatra Elson Azevedo.

Segundo o professor Jair Mari, do Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp), o jovem enfrenta um mercado de trabalho com baixas ofertas e um momento de mudanças tecnológicas que exigem cada vez mais qualificação diferenciada em escolas despreparadas.

“Nos extratos de baixa renda esses problemas se acentuam, o que pode induzir jovens a buscar alternativas como o tráfico de drogas e a prostituição infantil”, acredita Mari.

“A desigualdade social, os altos índices de violência e a expansão do mercado de drogas são fatores que se interpenetram e, a partir deles, surgem casos de risco ao suicídio”, complementa o pesquisador.

O Brasil é campeão de casos de depressão na América Latina. Quase 6% da população, um total de 11,5 milhões de pessoas, sofrem com a doença, segundo dados da OMS. É grande também o número de casos de transtornos de ansiedade e síndrome do pânico. Em 2015, 18,6 milhões de pessoas sofriam com transtorno de ansiedade no Brasil.

“Toda morte que ocorre em uma sociedade diz algo sobre essa sociedade. E a gente precisa refletir sobre o processo que a gente vive, a fragilidade dos nossos vínculos”. A reflexão é da psicóloga Ana Sandra Fernandes, vice-presidenta do Conselho Federal de Psicologia (CFP), em entrevista no Jornal Brasil Atual. Ouça a entrevista completa AQUI.

“O problema do suicídio é sério, complexo, multideterminado e precisa de políticas públicas efetivas para dar conta desse fenômeno. É muito importante a existência do Setembro Amarelo, mas a gente compreende também que não é suficiente para abordar os aspectos que envolvem o suicídio. É preciso falar de saúde mental e da prevenção ao suicídio todos os meses e todos os dias do ano”, disse Ana.

O contexto atual, que impõe praticamente uma inversão de prioridades na vida das pessoas, é um dos fatores que pode agravar o problema. “A sociedade capitalista exige cada vez mais, que a gente trabalhe, consuma, e parece que as relações vão ficando relegadas a um segundo plano. Temos observado de uma forma assustadora como a necessidade de atenção e afeto está muito presente na vida e no relato das pessoas e dos jovens. E estas relações vêm trazendo a gente algo que precisamos efetivamente pensar. Talvez seja urgente que retomemos conceitos de humanização”, propõe.

Os transtornos na saúde mental, o estresse, a ansiedade e os suicídios também são realidade nos locais de trabalho. A causa de quase um terço dos casos de afastamento no trabalho e pagamentos de auxílio-doença (30,67%) é transtorno mental provocado pelo ambiente de trabalho. Os dados são de um levantamento feito em 2017 pelo Ministério da Previdência.

Um estudo do Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise da Universidade de São Paulo – USP – (Latesfip) atesta que os transtornos mentais são resultados de um processo de exploração em que o trabalhador é submetido ao seu limite, a fim de atender aos interesses das corporações.

De acordo com o psicanalista Christian Dunker, professor da USP, o neoliberalismo descobriu que o sofrimento pode ser gerenciado e capitalizado para fazer o trabalhador aumentar a produtividade. A ideologia neoliberal, afirma o professor, aliena os cidadãos induzindo-os a aceitar que quanto mais são pressionados, mais eles produzem e, portanto, mais inseridos no sistema eles permanecem.

Opressão e suicídio

Um relatório chamado “Transsexualiadades e saúde pública no Brasil” apontou que o suicídio é uma das principais causas de morte de travestis, mulheres transsexuais e homens trans no Brasil. O relatório ainda aponta que 85,7% dos homens trans já pensaram ou tentaram cometer suicídio.  Outros estudos também evidenciam o cruzamento da questão racial e a maior pressão sobre a população trans não branca.

Para Marcela Azevedo, integrante do Movimento Mulheres em Luta, esse fator está diretamente relacionado com o fato dos setores oprimidos da classe trabalhadora sofrerem com maior peso as mazelas do capitalismo.

“Infelizmente, o sofrimento dos setores oprimidos é o que permite ao capitalismo garantir maior lucro. Por isso, as péssimas condições de trabalho – quando se consegue trabalho-, aliado ao aumento da discriminação, deixam esse setor da classe trabalhadora muito mais exposto ao adoecimento e as medidas trágicas”, disse.

“Discursos de ódio como os reproduzidos e incentivados pelo atual governo Bolsonaro tem aumentado esse risco, além da falta de serviços que possam dar a assistência devida à população. Por isso, o Setembro Amarelo é importante, mas insuficiente”, opinou.

Marcela, que também é terapeuta ocupacional e atua na área de saúde mental, destaca ainda que a política da burguesia e suas instituições é responsabilizar o indivíduo pelo adoecimento e pelo fim da própria vida.

“As religiões, em sua maioria, condenam a pessoa que cometeu suicídio e pressionam mais ainda aquelas que tentaram. Os serviços de saúde sucateados não dão conta da demanda e a sociedade, de modo geral, ainda trata os sintomas da depressão como fraqueza ou falta de vontade de reagir. Enquanto isso, o governo tenta privatizar o SUS e retirar as mínimas liberdades democráticas o que só aprofunda a situação de adoecimento social”, denuncia.

“É preciso pensar mecanismos coletivos de prevenção do suicídio, amparado em investimento e fortalecimento da rede pública de assistência psicossocial, assim como a luta para que essas políticas públicas devem vir associadas com a luta pela destruição desse sistema que tem em sua essência promover o adoecimento e a morte dos trabalhadores”, concluiu.

Com informações: Rede Brasil Atual, Unifesp
Fonte: CSPConlutas

 

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