Alerta: saque do FGTS é “remendo” para crise econômica e ameaça direito dos trabalhadores
O governo Bolsonaro anunciou nesta quarta-feira (24) uma Medida Provisória que altera as regras do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), permitindo aos trabalhadores sacar a partir de setembro deste ano parte do saldo do fundo, incluindo contas ativas e inativas.
Pela MP, no total, estão previstos saques de R$ 63,2 bilhões até 2020, sendo R$ 40 bilhões das contas do FGTS e R$ 23,2 das contas do PIS/Pasep (confira as regras ao final deste texto).
O discurso do governo é de que a medida irá “aquecer” a economia, mas na prática é mais uma medida paliativa que não combaterá o desemprego e a crise social no país e, pior ainda, ameaça o FGTS, que é um direito dos trabalhadores.
Além do valor de R$ 500 ter virado piada nas redes sociais pelo fato de não ser suficiente para aliviar praticamente em nada o endividamento que vive os brasileiros e muito menos servir para reaquecer de forma consistente a economia do país, marcada por um desemprego recorde e com risco de nova recessão, a política de Bolsonaro para o FGTS revela um problema ainda maior: a destruição deste patrimônio dos trabalhadores.
Bolsonaro já declarou por diversas vezes, inclusive nos últimos dias, que considera a multa de 40% do FGTS paga pelas empresas aos trabalhadores em casos de demissões sem justa causa um fardo para os patrões. Repetindo seu mantra de que os trabalhadores precisam escolher entre “ter empregos ou direitos”, deixou claro que é a favor do fim de mais este direito trabalhista. Os patrões também não se cansam de chorar e pedir o fim do FGTS, que equivale ao pagamento de 8% sobre o salário dos trabalhadores.
A política de diluir o saldo do FGTS dos trabalhadores em saques anuais é uma forma de começar a incorporar esse recurso como se fosse uma espécie de salário extra e descaracterizar o Fundo, que foi criado para servir como uma proteção aos trabalhadores em casos de desemprego.
A MP traz uma armadilha. O trabalhador que optar por sacar anualmente parte do saldo do FGTS no modelo chamado “saque-aniversário” perderá o direito de receber o saldo do Fundo na rescisão quando for demitido sem justa causa.
“O FGTS foi criado pela ditadura militar em 1964 para substituir o direito à estabilidade que existia até então. Naquela época havia uma indenização ao trabalhador no caso de dispensa de um salário por ano até o 10° ano. Agora, eles querem acabar até mesmo com esse direito”, relembra o integrante da Secretaria Executiva da CSP-Conlutas Luiz Carlos Prates, o Mancha.
O dirigente destaca ainda que o problema do FGTS é o roubo que governos fazem a este patrimônio dos trabalhadores ao longo dos anos. Há perdas acumuladas em razão de planos econômicos de 1987 a 1991 e perdas em razão do índice de correção aplicado ao Fundo. A TR (Taxa Referencial) aplicada atualmente sequer repõe a inflação. Segundo estimativas, as perdas acumuladas somam mais de 350%. Outro fato lembrado por Mancha é a Reforma da Previdência que alterou a regra de pagamento do PIS e retira esse direito de mais de 12 milhões de trabalhadores.
“Se o governo quisesse, de fato, garantir o direito dos trabalhadores deveria tomar medidas como a imediata reposição das perdas, atualizar o índice de correção, liberação imediata de todas as contas inativas, impedir demissões imotivadas, garantir estabilidade, reduzir a jornada de trabalho sem redução de salários, criar um plano de obras públicas para gerar empregos, estatizar empresas que demitem em massa, garantir emergencialmente seguro-desemprego para todos os desempregados, revogar a Reforma Trabalhista e a MP 881, entre outras”, citou como exemplos.
A descapitalização do saldo do FGTS traz ainda outro risco. Os recursos do Fundo são destinados em grande parte para o financiamento de políticas habitacionais. Com os saques e, consequentemente, redução dos recursos, há risco de reduzirem ainda mais o financiamento de moradias, principalmente para a população mais pobre.
Confira as mudanças no FGTS
A MP engloba basicamente cinco medidas. A primeira permite saques de até R$ 500 por conta do FGTS, ativa ou inativa, no período de setembro deste ano até março de 2020. Assim, se o trabalhador tiver duas contas poderá sacar R$ 1.000, e assim sucessivamente.
Se o trabalhador tiver conta poupança na Caixa, os recursos serão depositados automaticamente (é necessário avisar à Caixa caso não haja interesse). Se tiver conta em outros bancos, será necessário obedecer a um cronograma a ser detalhado pelo banco.
A segunda alteração cria o “saque-aniversário” que irá liberar valores a depender do saldo do trabalhador. Para contas com saldo de até R$ 500 será liberado 50% do total. Para contas acima de R$ 500 serão permitidos saques de um valor percentual mais uma parcela fixa.
Contudo, nessa modalidade, o trabalhador terá de abrir mão de receber todo o saldo em caso de demissão sem justa causa. Ele poderá retirar apenas a multa de 40% paga pela empresa sobre o saldo depositado na conta e continuará sacando anualmente, no mês de aniversário, o saldo do fundo parcialmente. Caso se arrependa de fazer a mudança, será preciso uma carência de dois anos para voltar ao sistema anterior.
Haverá ainda a liberação de recursos das cotas do PIS/Pasep (têm direito às cotas desse fundo os trabalhadores da iniciativa privada que tiveram carteira assinada entre 1971 e 1988 e não fizeram o saque durante o governo Temer); distribuição anual de 100% dos lucros do FGTS aos trabalhadores e uma espécie de “empréstimo” consignado com o FGTS como garantia.
Por essa modalidade, o trabalhador poderá pegar um empréstimo no banco e dar como garantia o saldo que tiver direito a sacar anualmente e as parcelas serão descontadas diretamente da conta do FGTS do trabalhador.
Fonte: CSP Conlutas